quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

Estas últimas semanas

 

Tanta coisa a acontecer e tão pouca vontade de partilhar.

Confinamento rima com amortecimento... dos sentidos no meu caso. Instalam-se umas rotinas tramadas de aulas online, tarefas, telefonemas, olhar pelas janelas para a pouca vida que se passa lá fora.

Olhar pelos nossos e sonhar.


Assente na experiência negativa do primeiro confinamento tenho andado muito. Aplicação no telemóvel que me vai dizendo os kms andados e pasmem já andei uma maratona!! Não foi toda num dia mas é uma vitória. Agora caminho para chegar aos 100kms. De vez em quando a aplicação apita  e envia frases de reforço. Muito bom! Está a funcionar não fora uma lesão num músculo que me faz olhar os táxis de uma forma apetecível no regresso a casa. Tenho resistido à tentação.

Os alunos estão a colaborar nas novas estratégias e penso que está a correr bem o E@D.

Neste entretanto fiz 60 anos! Uns dizem que é bom sinal porque muitos dos que conhecemos não chegaram a esta idade. Concordo mas mesmo assim foi um dia agridoce. É muita idade para uma cabeça que ainda se sente muito jovem. Ou pelo menos tenta todos os dias. 

Depois há os momentos de tristeza pura que guardamos no âmago do nosso coração e que sabemos que nunca mais de lá sairão. Fazem parte da vida mas custam a aceitar!


quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

A minha mãe

 


É dura como aço. Viveu dando-se sempre aos outros em primeiro lugar. Ela vinha em último se alguma vez chegou a vir. Tratou dos seus velhos, não como um fardo mas com a certeza do que é, sem receios ou medos que a impedissem.

Para nós tinha uma missão primordial: estudar, saber, tirar um curso. Nunca deixou que se questionasse este futuro. Por ser tão certo, aconteceu! Não me lembro de grandes festas de licenciaturas, de grandes abraços efusivos por estar a acontecer. Era o teu destino. Ponto! Cumpriu-se!

A ternura da minha mãe media-se em gestos e em acções. Nada de frases piegas, nada de mimimis. Amo-te, faço tudo por ti e tu sabes porque quando me pedes algo, eu fecho os olhos e deixo que aconteça. Por vezes, acompanho-te e vivo também os teus sonhos.

Implacável com o saber ser! Uma série de adjectivos saídos em rajada faziam qualquer um de nós voltar à linha. Que relice, dizia ela. E nós queríamos acabar com a relice dela.

Gostava de flores mas no jardim. Nada de ramalhetes como eu gostava de distribuir por toda a casa. As flores são para crescer e não para definhar em jarras por cima da lareira. E todos os domingos as regava para que permanecessem viçosas.

É dura a minha mãe. Já não há mães como ela! Toda a força com que empurramos a vida vem dali! Choramos de vez em quando, aliviamos as dores mas continuamos dando aos nossos o que aprendemos com ela.

Criou cimento entre nós sem saber dos livros como se faz. Vivemos tanta coisa juntos, envolveu-nos tanto nos seus dias que ainda hoje, em tudo o que fazemos, ela está ainda lá connosco.

Foi mulher de trabalho. Árduo, duro mas sempre com sentido.

Foi mulher de saudades que lhe partiam o coração mas que escondia só para ela.

Quando o meu pai partiu penso que desistiu de resistir! Abandonou-se!

Os seus velhos tinham partido todos e agora o seu companheiro de uma vida, a sua paz fora do corpo, tinha ido também.

Começou aí o seu desinteresse pela vida e chegou até hoje. Em confinamento, num lar onde não há visitas. A demência apagou memórias mas lá no fundo dela própria sabe quem é!

Apagou-se o seu olhar inquisidor de outros tempos. Aquele olhar ao qual nada se podia esconder. Ficou  a mansidão de um olhar triste, sem interrogações, porque já não há nada que queira saber.

Ainda nos reunimos os três, de vez em quando, à lareira da casa de sempre. Numa das últimas vezes entre conversas de memórias que só nós conhecemos, eu juro que a vi lá à mesa com o pai e a vi a rir das graças que se diziam. Devia ter prá aí 60 anos.

Na véspera dos meus 60 anos, este texto sobre a mãe andava a borbulhar no meu coração.

Será o teu exemplo que me conduzirá nesta nova década.

 Mãe! Já não há mães coragem como tu!

Devo-te tudo!