quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Foi necessário tempo


Na noite de domingo para segunda ardeu o Seixal. Não parece nada mas foi tudo.
Aquele soito tinha sido plantado pelo meu pai com todo o amor que sentia  pelas árvores. Muitas vezes se alvoroçou com a possibilidade de tudo arder em tempos de festas e de foguetes. Alguns sustos tivemos. Vivêmo-los com ele numa grande aflição com olhares de susto e de angústia pela possível morte  das suas árvores.
Quando ele faleceu fiquei  guardiã do legado. Reconheço que nem sempre tive o tempo suficiente.
 Ir até lá era encontrar-me mais perto dele. Percorrer as veredas, olhar o crescimento dos castanheiros, pensar no que ele sugeriria para esta ou aquela dificuldade.
Abria o portão semicerrado e as recordações vinham até mim. Por ali andava ele com a sua calma, com os seus conselhos, com os seus sorrisos que tanta falta me fazem. Este Agosto, já no final das férias, voltei lá envolvida pelo silêncio das manhãs de Estio. Percorri mais uma vez os caminhos que conheço de cor. Passei pelas árvores que plantámos juntos e dei conta da velhice delas. Ouvi os meus passos e sonhei os passos dele, sempre ao meu lado. Olhei a mesa de ferro para lautos piqueniques que ele lá colocou sonhando reuniões de família já com netos irrequietos  que pouco a pouco foram envolvidos pelo amor eterno do avô.
Já com a manhã alta, regressei não sem antes encostar o portão de ferro como que encerrando dentro daquele espaço as memórias, os laços, as recordações, o meu amor pelo Homem que me moldou pelo exemplo. Meu querido pai! 
Como estarias hoje sabendo que aquele dia que tanto temias chegou e te levou as tuas árvores.
Segunda feira acordei  mais orfã.

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