Estávamos no início dos anos setenta. A família tinha-se mudado para Coimbra e tinha estreado há pouco tempo uma casa novinha em folha que meu pai comprou e apresentou à família.
Foi o tempo de eu me habituar a novos ambientes frequentando outras casa de outras famílias que pouco a pouco foram fazendo parte do meu ADN. Comecei a frequentar festas de aniversários coisa nova para mim, vinda da aldeia onde estes festejos não existiam. Aprendi depressa que cada família tinha o seu bolo preferido e fiquei encantada com um de amêndoa coberto com ovos moles que eu considerava super chic porque não levava farinha. Os meus olhos de menina absorviam a decoração bonita da mesa, os copos diferentes, os lustres acesos por ser dia de festa, a groselha em jarra altas, os presentes em embrulhos brilhantes.
Um ano, decidi que também queria ter uma festa de anos! Minha mãe disse que sim! Convidei um grupo de amigas.
Minha mãe nunca tinha estado em festas de anos de crianças da cidade. Arranjou para o lanche tudo o que ela tinha de melhor que incluiu uma travessa gigante de enchidos variados, feitos por ela com todo o amor do mundo.
Quando cheguei pronta para o lanche quase me enterrei de vergonha. Enchidos? E o bolo chic de amêndoa? E os rituais?
Penso que as minhas amigas gostaram da diferença. Só eu não apreciei, de todo, a festa de anos!
Coisas de crianças a crescer em ambientes que não faziam parte delas. Ficou-me para sempre esta recordação e um certo remorso pelo que senti naquele dia. Não ter tido a maturidade suficiente para valorizar as minhas raízes e me sentir orgulhosa delas deixa-me envergonhada até hoje.
O que eu daria para ter uma travessa cheia de enchidos fritos pela minha querida mãe neste próximo aniversário. O que eu daria!