Os bonzinhos que tudo têm e dedicam a maior parte do seu tempo a competir pela nota, pelo prematuro lugar ao sol, não me seduzem. Depois de tantos anos a seguir percursos sei que não leva a nada esta competição excessiva, muitas das vezes, incentivada pelos pais e que os torna adolescentes perfeitamente infelizes. A vida se encarregará de lhes mostrar que não é esse o caminho. Não quer dizer que os trate mal nem dê o melhor de mim, mas não me ficam no coração. Não valorizo a cabulice mas a competição deve ser connosco e não com os outros.
Dizia que gosto de alunos difíceis. Entrar-lhes na alma e perceber por que razão são assim. Encontram-se vidas tão, tão difíceis que me admiro como continuam a caminhar sobre tantas pedras e sem defesas. Gosto de falar com pais e encarregados de educação, perceber o porquê e tentar ajudar.
Quando deixo de ser professora deles fico com muitas saudades. Tenho-me lembrado do Filipe! Fui professora e directora de turma dele no 9º ano. Refilão, tinha comportamentos em outras disciplinas conducentes a processos disciplinares e não era muito simpático para alguns professores. Eu gostava dele e ele sabia. Inteligente mas cábula, no final do ano, quase a fazer 18 anos, ficou retido. Não consegui virar a situação e ainda hoje considero uma falha minha que não me perdoo.
Tinha de se inscrever nas provas como aluno externo e como não o fazia telefonei-lhe. Que não vinha porque não havia autocarro. Fui buscá-lo a casa, inscreveu-se e tornei a levá-lo. Admirou-me o carro e aproveitei para lhe fazer ver que na vida tem de se lutar para se ter as coisas de que gostamos. Que aquele carro só o tinha porque já tinha 60 anos mas antes, quando era mais nova, não era este o carro e nada me tinha caído do "céu aos trambolhões". A vida era luta e ele tinha de se fazer à vida. Acabou por reprovar nas provas e no ano seguinte acompanhei-o como professora coadjuvante. Chamava-me "a minha segunda mãe". Sabia imenso de Ciências e a professora titular admirava-se por ter ficado no 9ºano um aluno já com 18 anos e a saber tanto e avivava-me a culpa de não ter metido na cabeça daquele conselho de turma alguma sabedoria da vida e da volatilidade das coisas.
O outro dia estava na porta da escola. Abraçamo-nos com ternura. Homem feito, apresentou-me a namorada que me pareceu querida. Falámos dos outros tempos e segredou: naquela altura estava a passar por uma grande crise! Tão bom que recuperou.
Continuo com saudades dele. Foi uma turma difícil mas que tinha gente que necessitava de apoio, de mão amiga, de alguma assertividade e mão firme nunca esquecendo as feridas que todos os dias lambiam para não ficarem piores. Queridos alunos.
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