Não gosto de planícies! Nunca gostei! Cansam-me. Gosto de antever um novo vale, o que estará para lá do cume de uma montanha. Gosto de a sentir como uma barreira a ultrapassar. Desde que me conheço, "chegar ao alto" significa chegar ao cimo do monte mas significa também um esforço feito e uma barreira vencida. Sempre a subir, as pernas a doerem mas não havia o "voltar para trás".
Por esse tempo, as estradas eram de terra. Havia a alternativa da calçada romana mas a irregularidade das pedras fazia ainda mais penoso o caminho.
Depois do alto, era sempre a descer para o vale. Passava-se o cruzeiro e a casa de abrigo e estávamos lá. Na Senhora de Assedasse, a Senhora dos pastores. Perdida no nada da imensidão do vale, por entre montanhas. Uma imagem serena da Senhora que ali ficava todo o ano à espera da festa da aldeia em que participava.
Todos os anos, no final de cada ano lectivo, a minha mãe rumava à Senhora para fazer romaria e agradecer os bons resultados dos filhos na escola. Chegados lá, fazia-se a romaria à volta da capelinha, três voltas, mais precisamente. Depois, agradecia-se, comia-se a merenda e voltava-se para casa com a certeza da comunhão com algo que nos fazia sentir bem.
Passaram muitos anos em que não fui por aqueles lados.
No sábado, quando cheguei, já com estrada alcatroada, senti violentamente a beleza do lugar e vi a minha mãe nova, cheia de vida e de autoridade, fazendo a romaria. Agora, também ali estava mas já como uma sombra pálida daquilo que foi.
No final da tarde, sem ninguém combinar nada, começámos a fazer a romaria. Ninguém perguntou nada, ninguém perguntou porquê, ninguém estranhou. Velhos e novos, alguns ali pela primeira vez, fizeram as voltas à capela em profundo silêncio.
Um final de dia que calou muito fundo no meu coração.
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