Fiz ontem as contas e foram mais de trinta mil os dias em que adormecemos e acordámos juntos, na cama onde agora te escrevo e de onde espero sair para ir de novo até ti. Trinta mil dias a olhar-te dormir, a saber o frio ou o calor do teu corpo, a perceber o que te doía por dentro, a amar cada ruga a mais que ia aparecendo. Trinta mil dias de eu e tu, desta casa que um dia dissemos que seria a nossa (que será de uma casa que nos conhece tão bem quando já aqui não estivermos para a ocupar?), das dificuldades e dos anseios, dos nossos meninos a correr pelo corredor, da saudade de nos sabermos sempre a caminho de sermos só nós. Trinta mil dias em que tudo mudou e nada nos mudou, das tuas lágrimas tão bonitas e tão tristes, das poucas vezes em que a vida nos obrigou a separar (e bastava uma tarde longe de ti para nem a casa nem a vida continuarem iguais). Trinta mil dias, minha velha resmungona e adorável. Eu e tu e o mundo, e todos os velhos que um dia conhecemos já se foram com a velhice. Nós ainda aqui estamos, trinta mil dias depois, juntos como sempre. Juntos para sempre. Trinta mil dias em que desaprendi tanta coisa, meu amor. Menos a amar-te.
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